terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Seguir em frente vai um tanto além do que quer dizer o clichê. Seguir significa pegar tudo o que já se tem consolidado por algum tempo, maior ou menor nao importa, e de alguma forma jogar pro alto e com uma tacada digna de um campeonato de baseball acertar em cheio com a pretensão de que ou voe para longe ou se desfaça em mil pedaços, e nesses mil pedaços, como sugere o otimismo, enxergar confetes. É algo difícil, engraçadamente difícil porque não é esperado que abandone algo que algum dia foi trabalhoso de se criar, digo, de se manter porque como as coisas vivas o surgimento pode acabar se dando ao acaso, mas a perseverança em existir exige um esforço além. Realmente invejo as crianças com seus castelos de areia que veem na maré alta a oportunidade de um novo divertimento, infelizmente adultos não constroem castelos de areia para serem levados. Pode estar ai o erro, construir nossos castelos tão somente de areia.

terça-feira, 23 de outubro de 2012


Acaba que os velórios acabam por ser o passo essencial para a superação do luto. O marco inicial do luto e da própria superação deste. Todos precisamos dos nossos cadáveres para que sejam enterrados, as lágrimas, o sofrimento, o apoio dos que nos cercam acabam por criar o plano de fundo substancial para a integralidade do luto. Precisamos ver nossos mortos realmente mortos, frios, encobertos pelos planos egoístas que acabamos por criar sob o solo incerto das nossas expectativas, simplesmente ignorando até a morte do outro.
Não me refiro ao significado banal que alguém resolveu dar a morte e registrar em algum dicionário, me volto a todo tipo de morte, a todo significado que acabamos por associar a morte. Precisamos do som abafado da terra batendo a tampa do caixão, precisamos da confirmação, de que nenhum som de vida ecoa por dentro das paredes de madeira, apenas o som da pá do coveiro ficando a terra. É necessária a certeza de que lá estão,  afinal torna-se doloroso demais levar flores a túmulos com caixões vazios, e a certeza da sentença final acaba que, ainda que tardiamente, nos force a  deixar de idolatrar a dor encoberta por afrescos. Afinal, se ali não estão resta apenas a esperança de que quando a campainha soar não será apenas o entregador de cartas, ainda que tenhamos a certeza de que sempre o será. 

quinta-feira, 27 de setembro de 2012


E acho que se pode considerar o estado de "felicidade" como um estado transitório magnífico.Talvez estar feliz (sim, estar feliz, porque o verbo correto acaba por facilitar bastante esse paradigma do "ser" feliz) acabe por se resumir em uma simples equação. Um equilibrio que se consegue ao final do dia ao colocar a cabeça no travesseiro e começar a somar e subtrair, simples como o que quando criança nos desafiavam a fazer, soma-se o que se teve de bom, soma-se o que não foi tão bom assim, e subtrai-se uma coisa da outra... simples e complexo quando tinhamos sete anos. Entretanto a dificuldade que se tem hoje está em estabelecer os termos,discernir o que foi bom do que nem foi tão assim. Não me atrevo a dizer o que foi ruim, porque me falharia a maturidade ao não perceber que nada é de todo ruim, o máximo que se pode acontecer seja um equívoco durante a interpretação. muitas vezes acabamos por nos poluir com todos os artificios que naturalmente acabamos criando em função do drama próprio, porque simplesmente radicalizamos de tal forma que o que acabou por nao seguir a cadencia linear desejada se torna algo ruim, e na maioria dos casos, algo bom permeia, basta um olhar um tanto otimista e não menos poético. Ao final de tanta matemática, como todo cálculo, obtém-se um saldo que segue a eterna dicotomia do positivo e do negativo. Se o primeiro, ótimo, considere-se praticando o verbo correto, estar feliz. Se negativo, simplesmente lembre-se de que logo um novo dia começa e outros algarimos se acumularão, e não veja nisso apenas como um clichê de tantos livros de auto-ajuda, veja como a possiblidade de multiplicar o saldo negativo por zero,afinal, é isso o que o dia depois de hoje acaba por ser, uma multiplicação que zera tudo, e o zero é o resultado que insiste que se pode subir ou descer, e que isso depende apenas dos próximos esforços.

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Sobre o luto


              Foi então que, com o ar e a elegância de um guerreiro que cai aos pés do inimigo, ele vestira o luto que por tanto havia adiado. É humanamente trabalhoso o confronto que se trava com a morte, aliás, é quase que um espetáculo dramático esse tão peculiar equilíbrio que chamamos de vida, e que por muitas vezes o tratamos tão somente como um equilíbrio, uma equação que precisa ser balanceada a nosso favor, e tão somente a ele. Esquecemos os pormenores que podem caber e acabar por completar os espaços entre esse começo tão glorificado e esse fim tão abominado pela maioria.
Desde  muito tempo ele achava que a morte acabava por ser um espetáculo de egos, um ritual de auto-consolação, via no funeral o maior de todos os dramas que pode gerar o egoísmo. Já quando pequeno, segurado pela mão da mãe ao pé do caixão de sua avó, questionara “por que todos choram mamãe?”, e com um sibilo tão bem ensaiado quanto o lenço que levou ao nariz, a progenitora explicou “ pois vovó partira”.
              Não foi ali, ou no dia seguinte, ou no mês seguinte (mas não importa o tempo que se leva, mas o resultado que se tem) anos mais tarde ruminando memórias que percebeu um detalhe  já  tão intrínseco que passa por despercebido aos olhos, tão falhos que sabe-se lá por que Deus, ou explosão cósmica, ou qualquer força que trate a metáfora, foram feitos tão falhos ao não poder olhar para o lado de dentro. Percebera um dia que o sofrimento se  dá não por quem morre, mas pelos que não acabaram por ter o mesmo destino, sofre-se pelo egoísmo instintivo, sente-se não a perda sentimental, mas sim a perda que diz respeito a posse.
                Enfim, ele acabou por chegar nesse ponto de confronto com a perda, do desfalque pessoal, e por isso achava que sofria. Metodicamente, como costumava ser, tratou de passar por todos os estágios da aceitação que algum dia lera em algum panfleto em uma sala de espera. Negação, ira, barganha, depressão, aceitação. Tão suave ao ponto de surpreender-se com a naturalidade que fluía de um estágio ao outro, sem trancos, sem maiores dramas, acho porque acha-se que a morte pode acabar por ser o maior deles, ou pelos mais otimistas, o fim deles.
              Levantou-se da cama, lavou-se, e partiu para a cerimonia fúnebre que esperava  de longe ser a mais dolorosa que presenciaria, aprontou-se como sugere o protocolo e estacou-se frente ao espelho, começara o velório. Como diz a tradição, velou o morto em cada segundo, cada detalhe, sofreu cada suspiro em que caberia sofrimento. Manteve-se a vestir o próprio luto, a velar o próprio eu, ou o que um dia acabou por ser. Ele tinha em algum canto cinza da consciência a certeza que sabia não ser equivocada, de que morrera, e tinha razão, a morte vem em diferentes alegorias, em diferentes embalagens e ele aceitara aquela que julgara mais sutil. E tinha razão quanto a sutileza dos fatos, a mudança acaba por ser uma morte velada, silenciosa, um acordo suave entre o que se é e o que virá a ser.
          Olhava para si próprio e via que o que lhe era cotidiano já não vivia ali, aquele olhar não era o mesmo, o sorriso não menos, até os cabelos obedeciam à outra harmonia. Definitivamente o que morava ali descansava, se em paz ainda não sabia, mas que já fora substituído era fato, se melhor ou pior, teria de aproveitar o tempo entre esse sutil nascimento que se dera em seu interior e a morte futura que o aguardava para descobrir, afinal a morte assim como a vida acaba por obedecer a um ciclo, onde  o começo de uma é o fim de outra e vice versa. Olhou novamente no espelho, apertou a gravata e saiu pela porta, sabia que tinha pouco tempo para dar as boas vindas a esse novo estranho.

sábado, 18 de agosto de 2012

Do medo.

E foi na certeza de que eu sempre sobreviveria que insistentemente continuei fazendo as coisas da forma mais errada possível. E na realidade eu realmente sobrevivia, sempre encontrava uma forma de me levantar e continuar a caminhada, melhor recomeçar essa eterna caminhada circular. Contudo o que eu não sabia, e deveras demorei a perceber, era que eu sobrevivia, entretanto sobrevivia em partes. Funciona mais ou menos como uma corrida em um campo de cercas de arrame farpado, sobrevive-se bem, entretanto a barganha que se estabelece pode ser um pouco dolorosa, deixa-se fiapos pelo caminho e leva-se marcas pelo corpo. E foi em um dado momento em que de repente me vi marcado de mais e desfalcado de mais do que um dia foi meu, ou do que um dia fui realmente, encontrei no medo uma chance de proteger o que ainda restava de um edificio ja depredado. Nao digo o medo de me arriscar, o medo de tentar, esse medo que se tornou tao inflexivel no vocabulario humano, digo o medo de acabar por nao sobreviver, um medo que me impunha a condiçao de fazer as coisas da melhor forma possivel, um medo que por hora tem me feito escolher o melhor caminho possivel, porque ele frequentemente me sussura: "não, você não é imortal, e as coisas podem acabar por nao terminarem da forma que voce pretende, e segundas chances não sao tão baratas quanto se pensa."

domingo, 22 de julho de 2012

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E quando por um acaso você resolver passar uma hora a mais na cama, de frente a tv, uma hora a mais odiando alguém, uma hora a mais amando o dinheiro mais que a voce mesmo, lembre-se que em uma hora se tem 60 minutos, e em um minuto seu coração bate em média 75 vezes, ou seja, você apenas está perdendo 4500 batimentos cardíacos com uma coisa que realmente não tem importância, e olhando mais de perto e com mais carinho e poesia, perde-se 4500 chances que o universo te dá para tentar fazer tudo novamente, e o mais parecido com o que deveria ter sido da primeira vez. Assim, você acaba percebendo que esta perdendo bem mais que uma simples hora. 

segunda-feira, 16 de julho de 2012

Aos incansáveis atores


Acontece meio que assim: conhecemos alguém, a partir daí começamos a nos modelar de forma que passamos a nos parecer o mais fiel possível com aquilo que achamos que ela gostaria que nos parecemos. Criamos uma projeção que pensamos se encaixar o mais adequadamente possível às ambições alheias, e acho que em meio a tantas e diferentes projeções, chegamos a um ponto em que a bagunça é tanta que já não temos o discernimento de quem realmente somos, ou melhor, de quem um dia fomos, antes de tantos papéis e tantos cenários que criamos. É ai onde tudo começa se fragmentar, porque querendo ou não, um dia queremos algo além de um espetáculo, queremos simplesmente que as cortinas não se fechem, e que o ator em si se torne o protagonista, queremos o papel principal, entretanto os personagens ainda falam mais alto, entornamos lágrimas que não são nossas, entoamos cantos que não nos fazem o menor sentido, sorrimos sorrisos amarelos e gelados, tudo perfeitamente ensaiado, ensaiado para acabar ao final do último aplauso. O último aplauso, as cortinas se fecham, as luzes se apagam, máscaras são tiradas, ninguém vê nada, ninguém sente nada, enquanto se tira a maquiagem uma lagrima escapa, mas é apenas o pó nos olhos, afinal não há tempo, outro espetáculo logo tem de começar.