Lembro-me de um até mais que
sábio conselho de uma professora: “ser
adulto é aprender a administrar o prejuízo”. Acredito que seja essa a
síntese mais que bem feita e não menos completa do sentido de ser adulto. Entretanto
com esses, mesmo que poucos, dias de “adulto”, acho que junto a administrar o
prejuízo soma-se uma gama de outras nem tão pequenas e simples coisas. Sim, vai
um pouco além. Saber balancear o peso que se carrega, afinal nem todo fardo,
mesmo que necessário, é útil. Escolher o que fica e o que vai, ou ainda quem
fica e quem vai, é uma questão simples como organizar uma gaveta, que a tempos
não se abre, abre-se e se depara com um monte de coisas guardas, não raro um
tanto desorganizadas. É simples. Isso se guarda. Isso se joga fora. Isso se
guarda. Isso se joga fora. Isso se joga fora. Isso se joga fora. Isso se joga
fora. Isso se guarda. Isso se guarda... e orgulhosos de nós mesmos e de nossa
incrível capacidade de discernimento olhamos para uma pilha de coisas inúteis.
Fácil agora, basta jogar tudo no lixo. Errado, está ai a parte complicada. Como
jogar fora amigos antigos? Eles nos fazem lembrar que em alguma parte fomos
bons o suficiente para um dia os ter feito. Os dias ruins? Como descartá-los se
eles são a prova viva de que vivemos dias bem melhores. As derrotas? Elas
servem como manual de como encarar os novos desafios, sussurrando aos nossos
ouvidos que podemos estar cometendo os mesmos velhos erros. Os amores mal
resolvidos? Eles são como post its que nos fazem lembrar que um dia fomos
capazes de sentir algo que ia além de nossas obstinações particulares. Nossos
defeitos? Esses sim são os mais difíceis de nos livrar, eles são capazes de
falar sobre nós mesmos muito mais que imaginamos, afinal somos os nossos
defeitos e o que fazemos para corrigi-los, quando fazemos algo é claro. E ao
final desse apanhado de reconsiderações somos obrigados a digerir uma
realidade, ainda que indesejada, somos incapazes de abandonar coisas pelo
caminho, por mais que elas atrasem nossos passos, por mais que emperrem nossas
ambições. Infelizmente, ou até felizmente, funciona meio assim, sabemos bem o
que nos atrapalha, mas somos incapazes de ser displicentes o suficiente para
que não nos pese. Creio que reciclar tudo isso seja a melhor forma de tê-los
por perto, converter todo o possível a nosso favor, como uma pá de esterco em
um canteiro de margaridas, fétido, mas necessário. Quanto a parte do
“administrar o prejuízo” acredito que seja difícil demais, ser adulto é difícil
demais, fecha-se então as gavetas ainda com o que se tinha antes, pesadas e
cheias demais, mas o melhor é fechá-las e espera-se que fique tudo bem. Mas
não, não ficará. Um dia você vai dormir criança e acordará adulto e suas
gavetas estão entupidas demais para que se guarde outras tantas coisas
necessárias, e isso nos faz adultos cheios demais, e vazios. Cheios demais para
aceitarmos o prejuízo.
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